O mercado de crédito financeiro é de fundamental relevância no Brasil de hoje. Segundo dados do Banco Central, o ano de 2023 fechou com um saldo de crédito ampliado na casa de R$ 15,6 trilhões, valor superior ao PIB do país, sendo R$ 3,4 trilhões relativos ao crédito livre, que é aquele que não possui destinação fixada em contrato.
Isto é, trata-se daquele crédito contratado com financeiras e bancos, em que uma pessoa física ou jurídica busca a instituição para aquisição do valor e não precisa informar qual a destinação do montante contratado.
A concessão de crédito se mostra, portanto, um elemento importante para o cenário macroecômico, mas com papel relevante também na microeconomia, pois permite às famílias o acesso à bens e serviços que, sem a concessão do crédito, dificilmente seria possível.
Tendo em vista o potencial econômico que o mercado de créditos oferece, nota-se a presença de inúmeras instituições financeiras, que alcançam a marca de 155 em operação no Brasil, de acordo com a FEBRABRAN.
Cada uma dessas casas financeiras buscou, com o desenvolvimento de suas atividades, especializar-se no atendimento de certos tipos de clientes. Algumas atendem somente aposentados e pensionistas, um tipo de empréstimo seguro, pois a renda é fixa, enquanto outras atendem pessoas que oferecem mais riscos à operação, sem que haja a apresentação de garantia do pagamento, com possibilidade de inadimplência maior.
É natural, portanto, que cada instituição leve o fator RISCO em consideração na hora de fixar as taxas de juros de seus contratos. Quando um cliente busca a financeira, vários aspectos da vida pregressa do cliente são levados em consideração: histórico com a financeira, renda, histórico de negativações etc. Além disso, custos da operação também são considerados na fixação do valor cobrado do consumidor.
Diante disso, é de extrema importância o trabalho feito por financeiras especializadas em atender pessoas negativadas e que tiverem negado o acesso ao crédito em instituições tradicionais. Contudo, o RISCO que esses clientes oferecem, possui um custo, que é cobrado por meio das taxas de juros negociadas em contrato, sendo esta a forma de arrecadação da instituição financeira.
Em consulta ao site do Banco Central, pode-se observar que há uma diferença de mais de 88 vezes entre a instituição financeira que cobra a menor taxa de juros mensais e aquela que cobra a maior.
É evidente que essas instituições financeiras não atendem o mesmo perfil de cliente, de modo que é impossível que elas cobrem as mesmas taxas de juros de pessoas com análise de RISCO totalmente diferentes.
Para tentar mitigar o problema, o BACEN informa mensalmente a média das taxas de juros cobradas pelas instituições financeiras para os mais variados tipos de empréstimos. Essa taxa de juros média é utilizada no país todo como fundamento para definir se as cláusulas de contratos de empréstimos são ou não abusivas.
Contudo, conforme o STJ (REsp n.º 1.821.182/RS), a utilização somente dessa taxa divulgada pelo BCB é um equívoco, pois ela aglutina contratos com características muito diferentes em um só número, ignorando, por exemplo, o perfil de risco dos clientes de cada instituição e, mais que isso, a média é justamente a composição entre taxas maiores e taxas menores, não sendo um teto para a aplicação de juros em cada contrato.
A taxa média disponibilizada no site do Banco Central considera 67 instituições financeiras, que possuem clientes de perfis diversos, dos mais seguros aos mais arriscados. Isto é, há casos em que a taxa de juros cobradas é inferior à média de mercado, ao passo que há casos em que taxa de juros é superior, a depender do perfil do cliente e das garantias dadas no negócio realizado.
Há instituições que se colocaram no mercado para conceder crédito para pessoas com risco elevado de inadimplência e que não concedem garantias no momento de tomar o empréstimo. Destarte, a fim de que o negócio seja atrativo economicamente, é necessário que sejam estipuladas taxas de juros específicas, diferentes daquelas relativas a clientes seguros, com alta renda e patrimônio.
Diante disso, entende-se que uma análise mais acertada e justa da abusividade das taxas de juros deve levar em consideração, para além da taxa média divulgada pelo BACEN, o perfil do cliente contratante, o histórico de negativações em órgãos de proteção ao crédito, o inadimplemento em contratos anteriores e demais aspectos considerados na hora da fixação das taxas de juros contratuais. Em suma, deve-se levar em consideração o risco ao qual a instituição se submete sem qualquer garantia de que receberá a contraprestação devida com o pagamento das parcelas pelo tomador do crédito.
Autores:
Mariana Muniz Casagrande, gestora de Direito Bancário e Financeiro
Gabriel Zonatto, advogado na área de Direito Bancário e Financeiro