Você ouviu falar em Spread bancário, mas ainda não entendeu como ele se constitui e quais circunstâncias influenciam na sua formação? Pode deixar que eu te explico.
Para contextualizar, a expectativa para 2023 é a de que a inflação recue, após um período sombrio gerado, principalmente, por uma pandemia sem precedentes. Com isso, a Taxa Selic deverá cair. Será que isso, efetivamente, reflete nas taxas de juros e na obtenção de crédito para o tomador final? Para responder essa questão, precisamos analisar o que é o Spread bancário e o que influencia na hora de contratar operações de crédito.
Em um primeiro momento, deve-se ter em mente que as instituições financeiras possuem o crédito como maior fonte de receita/lucro, de modo que utilizam do dinheiro dos poupadores (que são pessoas com recursos), concedendo um retorno financeiro para tanto, após um determinado tempo, e emprestam para o tomador de crédito.
Se esse repasse fosse feito apenas com base na Taxa Selic, o Banco não teria lucro, pois teria que repassar pelo mesmo valor que foi arrecadado com o poupador, ficando no “zero a zero”, não englobando o custo administrativo, o risco com maus pagadores (ou seja, o valor que o Banco perde com a concessão de crédito para pessoas que, eventualmente, não honrem com a dívida contraída), e demais despesas necessárias para o funcionamento administrativo da Instituição.
Por conta disso, é que existe o denominado Spread bancário, que se caracteriza como sendo a diferença entre o custo do capital/dinheiro dos poupadores versus o recebimento do recurso emprestado para os tomadores do crédito. Ou seja, por mais que seja visto como vilão nas operações bancárias, na verdade ele é a base da estrutura do crédito.
Um estudo da Fundação Getúlio Vargas[1] demonstrou que o Spread bancário do Brasil é o segundo maior no mundo, atrás somente de Madagascar. Mas por qual razão? A pergunta é simples, mas a resposta pode ser um pouco mais complexa, então precisaremos analisar por tópicos.
- Taxa de inadimplência: Não é segredo que, por questões socioeconômicas, a taxa de inadimplência no país é altíssima[2], ou seja, o tomador de crédito deixa de efetuar o pagamento do valor emprestado, e o Banco tem dificuldade de reaver o crédito concedido, e consequentemente repassa o prejuízo com os maus pagadores para as taxas dos próximos empréstimos, tentando compensar as perdas.
Aqui, vale destacar que a legislação brasileira – quando comparada com outros países – é bastante permissiva, o que acaba fazendo com que as instituições financeiras não tenham êxito na maioria das execuções de dívidas;
- Depósito Compulsório: Trata-se de uma taxa que o Banco Central cobra dos bancos e instituições financeiras – de parte do recurso captado dos clientes – como ferramenta para controlar a liquidez no mercado (garantindo o poder de compra da moeda), evitando o multiplicador econômico.
Quando o Banco Central aumenta a porcentagem do Depósito Compulsório, ele diminui a reserva bancária, ou seja, o banco tem menos recursos para emprestar, o que também é repassado para o Spread e acaba encarecendo o empréstimo;
- Fatores tributários: PIS/Cofins. Aqui poderá haver mudança, porque no finalzinho do ano de 2022 foi suspenso – por pedido de vistas do Ministro Dias Toffoli – o julgamento de uma ação bilionária, no Supremo Tribunal Federal, sobre o recolhimento de PIS/Cofins das Instituições Financeiras. Importante destacar, que o Ministro Ricardo Lewandowski se inclina à uma posição favorável aos bancos, no sentido de que estes têm direito a recolher contribuições sobre uma base menor do que a pretendida pela União. Estamos de olho nas atualizações do julgado, principalmente pelo fato de que o risco monetário para a União é de mais de R$ 100 bilhões.[3]
- Fatores administrativos: Nesse item, engloba-se o custo administrativo do Banco para gerenciamento do crédito (funcionários, custos contratuais, burocracias inerentes ao processo de concessão de crédito, material, e demais despesas administrativas);
- Concorrência: Ainda é muito baixa no Brasil, pois é muito recente a ascensão de outras instituições financeiras, como as Fintechs, principalmente na concessão de crédito de maiores valores, como financiamento habitacional.
Entendendo como se constitui o Spread, é que conseguimos ter uma dimensão do motivo pelo qual o crédito no país custa o que ele custa.
Para que o Spread fosse reduzido e o consumidor sentisse no bolso a diminuição da taxa de juros, ou seja, para que o crédito se torne mais barato, a inadimplência precisaria ser reduzida/controlada, a competitividade aumentada (concorrência ampliada), ocorresse maior disseminação de informação sobre o histórico do cliente (Open Banking) – pois instituições menores têm mais dificuldades de acessar informações que os bancos maiores – e desenvolvêssemos uma melhor estabilidade tributária, aqui se considerando até a Reforma Tributária. Inclusive, que é bastante esperada para o ano de 2023.
[1] BALASSIANO, Marcel; VIDAL, Vitor. A parcimônia com o mercado de crédito. FGV, 2019. Disponível em: <https://blogdoibre.fgv.br/posts/parcimonia-com-o-mercado-de-credito>. Acesso em: 15 de janeiro de 2023.
[2] Mapa da Inadimplência e Negociação de Dívidas no Brasil. SERASA, 2022. Disponível em: < https://www.serasa.com.br/limpa-nome-online/blog/mapa-da-inadimplencia-e-renogociacao-de-dividas-no-brasil>. Acesso em: 15 de janeiro de 2023.
[3] BONFANTI, Cristiane. STF: julgamento sobre PIS/Cofins sobre receitas de bancos é suspenso. JOTA, 2023. Disponível em: <https://www.jota.info/tributos-e-empresas/tributario/stf-julgamento-sobre-pis-cofins-sobre-receitas-de-bancos-e-suspenso-14122022>. Acesso em: 17 de janeiro de 2023.